Pesquisa analisa a relação entre uso do tempo, desigualdades sociais e desempenho escolar

foto relógio escola

Pesquisa avalia atividades diárias de alunos, educadores e responsáveis para relacionar com o desempenho escolar. (Foto: br.freepik.com)

A forma como usamos o tempo afeta nosso desempenho? Esse é um dos questionamentos que o grupo de pesquisa da UFJF Equidade, Políticas e Financiamento da Educação Pública busca responder.Coordenado pelo Prof. Fernando Tavares Jr. (ICH), o grupo organiza-se de forma interdisciplinar, reunindo professores de diferentes unidades da UFJF, como o Instituto de Ciências Humanas, a Faculdade de Educação, o Instituto de Ciências Exatas e a Faculdade de Economia, em torno de objetos de pesquisa comuns. Esta pesquisa, ligada ao Observatório da Educação (Obeduc), teve início em 2013 e acompanha alunos e professores de duas escolas de Juiz de Fora a fim de identificar fatores que concorrem para o êxito escolar e profissional a partir da forma como os alunos e suas famílias organizam suas atividades diárias.

A escolha das escolas públicas obedeceu a critérios de representatividade e perfil, sendo escolas típicas, similares a outras tantas encontradas pelo Brasil. São alunos do 5º e 9º anos, seus principais responsáveis e todos os professores das escolas. O coordenador do projeto e professor do Instituto de Ciências Humanas (ICH), Luiz Flávio Neubert, conta que a escolha por essas séries se fez em função de ser um período de mudança na vida acadêmica, “também representa todo o processo de desenvolvimento que ele teve até chegar àquele ponto. Conversar com todos os professores foi importante, pois mesmo que ele não esteja dando aula para o aluno do 5º ou 9º ano, ele fez parte de sua formação. Quanto aos pais ou responsáveis, eles são necessários para compreender melhor o contexto em que o aluno está inserido e como isso afeta seu desenvolvimento acadêmico”. O estudo iniciado em 2013 continuou em 2014 de forma longitudinal, acompanhando todos os alunos em sua trajetória até a conclusão do Ensino Fundamental.

Ao ser questionado sobre o diferencial da pesquisa, Neubert afirma que “o importante é produzir dados que mostrem a adequação daquilo que já encontramos na literatura sobre educação, como o impacto na aprendizagem proveniente da participação dos pais e de aspectos econômicos familiares. Nós não queremos saber apenas se existe essa influência, mas como ela acontece e em que nível. Quanto mais detalhados forem os resultados, mais relações fundamentadas nós conseguiremos fazer”.

Para isso, o grupo utilizou três frentes metodológicas: questionários, diários de uso do tempo e teste de proficiência. Os questionários foram respondidos pelos alunos, professores e responsáveis e continham indagações sobre o cotidiano, a escolaridade, atividades extras, dentre outros fatores de influência.

Além dos questionários, foram detalhados os diários em dias de semana e dias do final de semana, descrevendo em detalhes quanto tempo os sujeitos despendem para realizar cada uma das atividades desenvolvidas durante as 24 horas do dia. “Escolhemos esses dias pois eles mostram quais atividades são feitas em dias de semana e quais são feitas nos finais de semana, o que nos permite identificar nesse período as mudanças, que foram drásticas, na gestão do tempo. Os resultados obtidos foram tabulados de acordo com 11 categorias, que resumem bem o cotidiano dos participantes, como cuidados com o corpo, estudos e deslocamentos”, explica Neubert.

Com o apoio científico do Caed, a pesquisa integra também testes de proficiência, a fim de diagnosticar o nível de desenvolvimento cognitivo em função das habilidades e competências previstas para o Ensino Fundamental. Com isso, objetiva-se pela primeira vez no Brasil conseguir relacionar os resultados nos testes com dados sócio econômicos e o diário de uso do tempo, avaliando se uma boa gestão do tempo implica diretamente em melhor rendimento acadêmico.

fernando Tavares

O pesquisador da UFJF, Fernando Tavares, é lider do grupo de pesquisa que desenvolveu o trabalho. (Foto: Caique Cahon)

Por meio desses resultados, foi observado, por exemplo, que os alunos dedicam, em média, apenas meia hora do seu dia para estudar quando estão fora da escola, o que é uma quantidade muito inferior à desejável. Também se observou que o tempo dos professores é muito consumido por deslocamentos e tarefas não pedagógicas. Isso se refletiu diretamente no baixo número de horas dedicadas aos estudos e treinamentos, que é de 2% durante a semana e 1% nos finais de semana: um resultado baixo para quem quer atingir as metas estabelecidas pelo Plano Nacional de Educação. A gestão do tempo demonstra ser um elemento chave na diferenciação entre diferentes perfis de desempenho, tanto de alunos quanto de professores, embora ainda seja pouco considerada na discussão sócio-educativa. Tópicos como esses que o grupo pretende refletir com a comunidade, para, além de dar retorno para quem participou da pesquisa, contribuir para possíveis alterações na gestão educacional. E, segundo Neubert, “o interessante disso tudo é que não estamos apenas supondo, mas comprovando, a partir de evidências, qual é o grau de influência de cada um dos aspectos encontrados, o que gera maior confiança no trabalho”.

Os resultados obtidos pela pesquisa foram empregados na criação de um banco de dados, que servirá para a realização de novos cruzamentos entre essas informações, além de fundamentar futuras pesquisas. Fernando Tavares Júnior, professor do ICH e coordenador do grupo, se mostra confiante com o retorno da pesquisa: “nós acreditamos que as semelhanças que vamos encontrar entre os perfis dos alunos serão capazes de inspirar e instruir novas abordagens de trabalho, podendo servir como base para mudar as atitudes dentro das escolas e, quem sabe, para pensar em novas políticas públicas”.

Além disso, a pesquisa também apresenta influência direta na formação de uma cultura voltada para a pesquisa dentro da UFJF. “Nós estamos produzindo uma convergência entre diversas faculdades e influenciando alunos de graduação a se envolverem com pesquisas, a se iniciarem cientificamente e ingressarem nos programas de pós-graduação, o que resulta positivamente na construção de uma nova geração de pesquisadores preocupados com esses temas.”

O Grupo de Pesquisa Equidade, Políticas e Financiamento da Educação Pública além dessa pesquisa, desenvolve outros estudos interdisciplinares com pesquisadores de diferentes unidades, contando com apoio da UFJF, do Centro de Políticas Públicas e Avaliação da Educação (CAEd) e de órgãos de fomento, como a CAPES, o INEP, o CNPq e a FAPEMIG. As pesquisas têm se dedicado prioritariamente à produção de diagnósticos e análises acerca das Políticas Educacionais no Brasil.

Outras informações:

Fernando Tavares Jr.

Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais – (32) 2102-3113

Fonte: www.ufjf.br/portal